capítulos :15, 16, 17...
Já faz algum tempo q venho ensaiando prá dividir um dos capítulos mais importantes da minha vida, e por diversas razões ainda não consegui...então mãos a obra, coragem e pé no chão!
Numa dessas minhas idas e vindas, estava eu no interior de Minas Gerais, quando recebi uma telefonema, desses que te deixam cotente...
Precisavam da minha presença em Salvador nos dias seguintes para uma gravação, mas eu tinha acabado de chegar da Bahia e ido até Tiradentes de carro, levando parte da mudança, minha mãe de carona, Sarah e Mané (meus fiéis cães de guarda) e um CD de Ana Carolina que insistia em tocar, enquanto eu chroraaaaaava, lembrando do ex namorado, que tinha deixado na Chapada Diamantina e com o qual, eu vivia a terminar. 1.500km rodados e chorados, divididos num carro apertado entre sonhos, malas e um coração partido. Jurava que tinha achado o amor afinal, e vai ver que durante um tempo eu achei, o ruim foi não ter sido achada, lá na tal Chapada pelo dito também.
Então, assim recém chegada e ainda cansada, dessa; teria que viajar de novo até o aeroporto mais próximo que era em BH...para de lá partir para Salvador.
Chovia, a estrada molhada, eu com uma olheira prá lá de acentuada e um carro novinho que tinha ganho no dia, com laço de fita enfeitado, como se e para coroar o tal fim.
O estranho é que no dia anterior também havia chorado um bocado, com uma tristeza voraz, daquela que é capaz de arrebentar de soluços o peito.
Minha mãe muito tranquila, disse: filha, de carro você não vai... Minha idéia era deixá-lo no aeroborto em Confins e pegar na volta uns dias depois.
Como assim? Tinham dois carros parados ali do lado...e de que outro jeito eu viajaria até a capital?
Vai de táxi ou de ônibus, aproveita para dormir um pouco antes da gravação... disse Yarinha com convicção.
Procuramos um táxi para me levar a BH, mas não encontramos nenhum na cidade, o jeito era ir até São João Del Rey, pertinho, pegar um ônibus e partir. Fui bem mal humorada, o tal ônibus esperar...
Não subia em um desde mocinha, e já com a maturidade, achava o fim perder tanto tempo entrando de cidade em cidade até chegar ao destino final.
Mas com mãe não se discute, ela mandou eu aprumo... obedeci! Fomos até a rodoviária de carro, e antes do meu esperado veículo coletivo chegar, apareceu num escrito: Rio das Mortes, e eu disse, nesse não quero entrar. Rimos um pouco e discutimos o mal gosto do nome do lugar ...e quem nasce em Rio das Mortes é o que afinal?
Chegou um ônibus amarelo escrito Sandra , entrei, achei ruim e desci dizendo, não quero ir nesse aqui, não tem porta nem banheiro,( não imaginava ter que usar) mas me parecia estranho não ter. Minha mãe riu e me mandou subir novamente, de repente parecia que eu tinha uns 14 anos e estava indo para o sítio da tia Hermínia de castigo nas férias, mas eu já tinha 33... e tinha feito das estradas desse país, minhas amigas e companheiras, lembrei que um ano atrás, só de kms rodados foram 54 mil...por causa do Oi Brasil. Mas não teve jeito, subi e sentei na poltrona número 3.
Não era a minha e fui pra 4, era na janela ao menos, no sentindo oposto do motorista, e eu estava toda sem graça porque não tinha aquela porta que separa a cabine dos passageiros, e pelo espelho, via o motorista a me olhar ...
De km em km o ônibus parava, e dava impressão que até para a lombada ele ia perguntar: quer viajar?
É, eu tinha ficado muito impaciente e mal acostumada com prazos e estradas...não entendia o porque e prá que tanto parar.
Tínhamos viajado uma hora no máximo, quando passamos por São Brás do Suaçuí, prestei atenção na placa e lembrei que naquela cidade um ou dois anos atrás, tínhamos gravado... e ali naquela praça ainda via o MV Baldini dizer, montado num cavalo branco, até BH!!!
Sorri com a lembrança mas logo voltei a prestar atenção na estrada molhada. Uns 3 km passaram e do alto de uma montanha avistei na contramão, vindo em nossa direção um caminhão... A cada segundo passado ele parecia mais desgovernado e não ter nos visto, até então. Calculei rapidamente o tempo e pensei, se ele freiar, vai rodar na pista e vai nos acertar no meio. Foi terminar de pensar, colocar as mãos no rosto e esperar o impacto tosco de um caminhão baú vindo na pista em nossa direção.
Dali lembro de uma cena em slow, de tudo parecer meio matrix, e estar vendo numa precisão em super câmera lenta, a nossa caída que tempos depois fui saber, foi de 40 metros.
O ônibus parou numa espécie de riacho, e quando acordei, estava presa entre as ferragens, aos pés do motorista...explico: como não havia porta nem cinto de segurnça, quando batemos, caímos e eu não tinha onde segurar, então fui lançada para aquela barra de vidro e meu corpo girou em 90 graus, se encaixando entre o volante e os pedais do motorista. Muito tempo depois fui saber que fiquei quatro horas e meia espremida e soterrada em todas aquelas sobras do que era um ônibus,dentro de um espaço de 50cms. Meu joelho direito veio parar no meu ouvido, e o meu cabelo comprido, salvou meu rosto dos cacos de vidro, a outra perna abri num espacato e não sentia nada da cintura prá baixo, nem ao menos via meus pés.
Lembro em detalhes de ver uma equipe da TV Globo Minas entrar e perguntar se eu estava viva e querer me filmar, no que foram impedidos por alguém mais sensato que estava por lá. Um guarda rodoviário com o olhar assustado, parecia que tinha visto alma penada, que fala, quando comecei a perguntar: "Vocês vão me tirar hoje daqui? Tenho uma gravação importante, e acho que assim perco meu vôo se for demorar..."
Tadinha, delirando eu estava. A melhor sensação que tive foi quando os bombeiros chegaram, esses sim preparados para essas situações, um deles começou a conversar e a chamar meu nome quando a memória ia indo começando a escapar.
Aquela história de ver o filme da vida, é fato...e como num único ato, vi toda a minha passar. Daí lembrei de repente, que tinha a quem chamar, clamei por Irmã Dulce e sinto até hoje arrepios quando senti ela por trás, me abraçar. Ficou comigo ali, todo o tempo, e eu numa briga de fé, lembrava que tinha visto alguns dias atrás, um filme onde Jesus dizia a Thomé, a passagem do CRER para VER e não ao contrário, senti-me mais uma vez confortada e se fosse ali testada, passava com louvor. Sabia que Deus me protegia e até a própria Virgem Maria eu tinha chamado para me acompanhar. Quando vi o ônibus estava cheio, de anjos e querubins, no mundo real as pessoas apenas viam um bando de bombeiros e maçaricos chegando...Eu feliz delirando...
Trouxeram até um caminhão guindaste de uma mineiradora emprestado, para ver se daquele buraco eles conseguiriam me tirar. Enquanto isso o motorista preso por mim e as ferragens, dizia algumas bobagens e não parecia compartilhar muito da fé. Todos os demais passageiros há muito tinham sido tirados, só sobrava eu, o motorista e meus pés que eu não via ou sabia, se aquela altura, veria de novo.
Lembrei de partes da minha vida que não tinha vivido, de momentos em que não havia correspondido as expectativas depositadas em mim, lembrei da minha mãe, e tive medo que ela se sentisse culpada, por naquele ônibus ter insistido em me colocar. Resolvi que não tinha medo de nada, e mesmo prevendo ficar aleijada, resolvi resistir e ficar...
A dor começou a ser insuportável no peito e eu queria um copo de água tomar, chegaram os pára-médicos e água não me davam... por um mistério divino, de repente nem me toquei, de que isso não seria um bom sinal.
Cobriram meu corpo exposto com um pano, eu tendo muito frio temia pelo escurecer do dia, e não dar tempo de viajar...
Começaram a cortar os ferros para liberar meu corpo preso, e num passe de mágica, sem noção de quanto tempo lá tinha estado, começava a sentir agora um corpo inerte ser içado, para cima da montanha voltar. A chuva era fina e os curiosos rezavam, outros apenas fofocavam:
Está viva ou morreu?
Perguntei da minha bolsa, queria meu celular para minha mãe ligar antes da má notícia chegar...
A bolsa foi esvaziada por algum oportunista ou golpista que apareceu prá espiar. Quando abri os olhos, cheguei na pista e vi sirenes para todos os lados, ambulâncias soube que chegaram 36.
Não é que tinha um helicóptero azul e branco, parado me esperando para o hospital mais próximo levar?
Eita fé que compensa, no meio de tanta desgraça uma GRAÇA para eu comemorar, ouvi um médico dizer : anda logo, ela não tem mais do que 15 minutos...O piloto perguntou: vou pra BH ou pro Rio? "Nada, para na primeira cidade que tiver, e com sorte ela ainda vai estar viva até lá."
Desmaiei confortada...rs
Acordei com portas se abrindo e depois virei lenda na cidade de Conselheiro Lafayete, onde dizem que uma moça caiu do céu, era eu no helicóptero... pousando no estacionamento do hospital, motivo pro "fala fala" na cidade durantes dias seguidos; teria a moça morrido?
(continua)